terça-feira, 29 de maio de 2012

Material - Gênero: Memórias Literárias

Material utilizado no 3º encontro da Olimpíada de Língua Portuguesa.Gênero - Memória Literária

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Ficha 9 - Dizer de outro jeito

Texto: Da lamparina a energia elétrica

Texto:Um guia possível para elaboração de sequências didáticas



Pensamento, gêneros textuais e mediação do professor

Heloisa Amaral


Nosso objetivo é tentar esclarecer, com esta quinta leitura, como as seqüências didáticas e os gêneros textuais, quando associados, aumentam as possibilidades de sucesso do ensino de língua. Para iniciar, podemos dizer que isso acontece em razão de dois grandes motivos:

a)    por um lado, os gêneros textuais podem ser considerados megainstrumentos, isto é, grandes instrumentos que contêm uma variedade de pequenos instrumentos que dão suporte para as atividades de linguagem nas situações de comunicação (1).

b)    por outro lado, as seqüências didáticas organizam o ensino desses megainstrumentos que são os gêneros textuais (2).

Continue lendo, através do link abaixo.


I - Os gêneros textuais como megainstrumentos nas situações de comunicação

Comentamos, na leitura da quarta semana, que as situações de comunicação só ocorrem por meio de gêneros. Isto é, a qualquer momento em que nos comunicamos, fazemos isso por meio de gêneros. Comentamos, também, que sabemos, de um modo geral, qual o gênero apropriado para cada situação de comunicação porque os reconhecemos quando temos experiências socioculturais anteriores com essas linguagens. A capacidade de usar um gênero qualquer, como uma conversa cotidiana sobre o tempo, demonstra que temos grande conhecimento acumulado, ainda que de forma intuitiva, sobre gramática e sobre discurso (isto é, sobre como vai ser nosso modo de falar sobre o tempo). Sabemos colocar direitinho nossas frases corriqueiras, sem que ninguém tenha feito um ensino formal disso, como podemos ver pelo exemplo abaixo, que poderíamos dizer que pertence ao gênero "conversa sobre o tempo":

   -Será que vai esfriar?
   -Não sei, não. O homem do tempo disse que vai fazer quinze graus no fim da tarde.
   -Ah, quinze graus é frio pra mim. Sou friorenta. Nem trouxe blusa!
   -É, mas às vezes eles erram.
  -Tomara.

Esse diálogo cotidiano entre duas pessoas que conversam e "chamam" o homem do tempo para a conversa foi aprendido nas interações socioculturais. Não nascemos sabendo falar nem coisas cotidianas simples como essas. Se os gêneros do cotidiano são aprendidos, podemos deduzir que eles são ensinados, ainda que informalmente. Como também vimos na Leitura 4, tudo o que aprendemos, aprendemos nas situações sociais, com nossos parceiros mais experientes. No caso da fala, é de parceiros mais experientes que recebemos orientações precisas desde o início de sua apropriação. É só observar um adulto orientando uma criança pequena para ver como ele ensina mais do que falar, ensina a dizer.

Ás vezes, o adulto solicita a interação. Suponha a seguinte cena: a avó, com a criança no colo, aponta para a mãe da criança e orienta uma ação de fala: "Diga mamãe". A criança imita, dizendo "Ma...", sem completar a palavra. A avó retoma, negociando com a criança a extensão da palavra e a entoação, além do significado.

Apontando novamente a mãe (atribuindo significado à palavra), a avó repete a palavra separando as sílabas e dando a entoação correta, embora um pouco forçada, e repetindo o exercício muitas vezes, até que a criança sozinha seja capaz de dizer "mamãe". Também é preciso lembrar que todas as tentativas da criança, mesmo as mais incompletas, são saudadas com alegria pela avó. Quando ela consegue dizer "mamãe" direitinho então! A família inteira corre para a criança, festeja, dá beijos...Você conhece a cena. O ensinamento de língua feito no uso desse gênero familiar cotidiano envolve conhecimentos de fonologia, de semântica, de segmentação de palavra, de pontuação, além de conhecimentos discursivos, isto é, todos aqueles que estão "embutidos" na série de significações que essa interação proporciona que a criança aprenda.

Relembrando essa cena que certamente você já viu muitas vezes, é possível identificar uma situação de comunicação com todos os elementos: alguém que fala, para alguém que ouve, em um ambiente de produção de linguagem, provavelmente a casa, com uma intenção comunicativa, que envolve um jeito de dizer uma palavra carregada de significados a alguém. É procedendo dessa maneira que pessoas adultas de qualquer camada social ensinam suas crianças a falar os gêneros cotidianos e muitos outros.

Os suportes que a avó dá, no caso de nosso exemplo de interação, são os chamados "andaimes" que os mais experientes usam para ensinar os menos experientes a construir seus saberes. Os andaimes, no caso, são as repetições que a avó faz da palavra, envolvendo essas repetições com intenções afetuosas de ajuda para o desenvolvimento das capacidades de comunicação da criança. As imitações da criança são o modo de contínuo e sucessivo que ela usa para apropriar-se da palavra.

Essa cena demonstra o que já se disse na Leitura 4, citando Vygotsky: primeiro somos capazes de aprender nas inter-ações, nas ações entre as pessoas, para depois internalizarmos essa aprendizagem, produzindo conhecimentos pessoais. Essa forma afetuosa de atuar do parceiro mais experiente permite que a criança saia de seu nível real de conhecimento, caminhe amparada pela interação através da zona proximal e alcance, depois disso, um nível mais elevado de conhecimento.

O modo informal de usar os gêneros nas situações cotidianas de comunicação, e de ensiná-los mais ou menos espontaneamente nessas mesmas situações, pode nos dar muitas pistas de como eles são grandes instrumentos de comunicação que podemos usar em sala de aula. A cena cotidiana ressalta o fundamental do processo de apropriação da língua: é o uso do gênero nas situações de comunicação que o torna esse megainstrumento. Assim, quando ensinamos um gênero não-escolar, não podemos ter receios de levar textos não didatizados para a sala de aula. Ao contrário, devemos levá-los tais como são, em seus suportes originais, e construir andaimes para que os alunos possam internalizar, no uso, esses gêneros novos para eles e ampliar suas capacidades de comunicação.

Retomando novamente o exemplo da avó, muitas vezes você agiu como ela, nas interações em sala de aula com seus alunos, isto é, no uso de algum gênero (mesmo um gênero escolar aula de leitura, por exemplo). Certamente você usou andaimes para que seus alunos se apropriassem das passagens mais difíceis do texto lido, propondo discussões, retomando entoações em palavras desconhecidas, reforçando os acertos. Nessas interações, mesmo não nomeando as categorias dos conhecimentos ensinados, ensinou bem, e certamente seus alunos aprenderam. Usou, então, o gênero como megainstrumento.

II - Seqüências didáticas como instrumentos auxiliares no ensino dos gêneros textuais

Também vimos que as seqüências didáticas são um conjunto de atividades ligadas entre si, planejadas para ensinar um conteúdo, etapa por etapa. As atividades são organizadas de acordo com os objetivos que o professor quer alcançar para a aprendizagem de seus alunos e envolvem atividades de aprendizagem e de avaliação.

Essa ligação entre aprendizagem e avaliação numa mesma ação é o que chamamos de avaliação formativa. O comum nas antigas formas de avaliar era ensinar primeiro, avaliar depois. Avaliar era uma ação realizada para saber o quanto os alunos reproduziam daquilo que tínhamos ensinado. A avaliação formativa, ao contrário, tem a finalidade de saber o que vai ser ensinado e como esse "o que" precisa ser ensinado, com diversas adaptações ao longo do processo de aprendizagem. Nesse novo modo de avaliar, a avaliação vai se dando a cada momento, a cada etapa da seqüência, possibilitando a intervenção do professor nos processos de aprendizagem muito rapidamente, à medida que eles ocorrem, com o objetivo de ensinar mais e melhor. No caso da seqüência didática para o ensino de gêneros textuais, àqueles "andaimes" ou suportes próprios do uso do gênero como instrumento, colocados pelo professor de maneira quase natural ao longo do ensino (avaliações contínuas seguidas de intervenções imediatas), acrescentam-se, então, as intervenções planejadas sobre os aspectos do gênero que o aluno precisa dominar. Ações desses dois tipos (mais espontâneas e mais planejadas) descrevem a atuação do professor como mediador na zona proximal de conhecimento de seus alunos.

Ao mesmo tempo em que você ensina avaliando e avalia ensinando quando usa uma seqüência didática, você precisa criar situações para que os alunos interajam com seus colegas. Você sabe como as crianças são avaliadoras rigorosas! Ensinam os colegas, mas dizem francamente quando eles erram, às vezes de um modo muito duro. Mas quase sempre também ajudam, dão suporte. Você pode aproveitar muito bem essa disposição natural dos alunos se demonstrar a eles como é possível interagir mantendo a franqueza, mas sem ofensas.

Além da interação com você e com os colegas, o aluno precisa desenvolver práticas de auto-avaliação que lhe permitam internalizar "um interlocutor" com o qual possa conversar interiormente num diálogo com um "outro" que está nele mesmo, ou seja, conversar consigo mesmo para avaliar-se. Um bom modo de auxiliar os alunos a constituir esse interlocutor interno é fazer a construção coletiva de roteiros para produção de textos no gênero que se quer ensinar.

Como muitos de vocês já disseram no terceiro e-mail para Rose, é preciso organizar diversas atividades para dar conta do ensino de todos os elementos importantes do artigo de opinião. Essas atividades são formas planejadas de intervenção (e, portanto, de mediação planejada), ou seja, são suportes, andaimes colocados ao longo do processo de apropriação do gênero e da produção de textos no gênero. Assim, podemos concluir que o ensino planejado dos gêneros textuais em seqüências didáticas pode resultar em ótimas situações escolares de comunicação.

Resumindo e finalizando, para realizar uma seqüência didática eficaz para o ensino de gêneros textuais, você precisa:
  • propor que seus alunos produzam uma escrita inicial, sem maiores estudos prévios, que permita a identificação do grau de conhecimento que eles já possuem sobre o gênero em estudo;
  • planejar o ensino considerando o conhecimento que os alunos já têm sobre o gênero;
  • fazer perguntas que problematizem os conteúdos a serem aprendidos com esse estudo, aproximando o que os alunos devem aprender das vivências que eles têm;
  • propor desafios que possam ser vencidos pelos alunos. Esses desafios não devem ser nem muito fáceis, nem muito difíceis;
  • propor e incentivar o levantamento de hipóteses sobre os elementos do gênero em estudo (o conhecimento sobre o tema, sua forma própria de composição, seus elementos característicos), ouvir essas hipóteses e valorizá-las;
  • ampliar a discussão sobre os aspectos do gênero, com a finalidade de comprovar as hipóteses levantadas;
  • organizar pesquisas sobre o tema do gênero e entrevistas na comunidade para favorecer o domínio do conhecimento necessário pelos alunos;
  • dar informações sobre aspectos próprios do gênero em estudo.
  • organizar e sistematizar as descobertas e conhecimentos, realizando uma escrita coletiva com você no papel de escriba da turma;
  • propor a escrita individual a partir de um roteiro próprio para o gênero;
  • orientar o aluno para a auto-avaliação de sua escrita (veja o Roteiro para o aluno realizar a autocorreção do artigo de opinião Atenção! Este arquivo abrirá em um pop-up, verifique se seu bloqueador de pop-up está desativado);
  • avaliar a escrita dos alunos e interferir quando necessário, para garantir a aprendizagem de todos, de acordo com as possibilidades de cada um.


Referências bibliográficas:

(1) SCHNEUWLY, B., Gêneros e tipos de discurso: considerações psicológicas e ontogenéticas. In: Gêneros orais e escritos na escola. Trad. e org. de Roxane Rojo e Glaís Sales Cordeiro. Campinas: Mercado das Letras, 2004.

(2) SCHNEUWLY, B., DOLZ, J. Os gêneros escolares: das práticas de linguagem aos objetos de ensino. In: Gêneros orais e escritos na escola. Trad. e org. de Roxane Rojo e Glaís Sales Cordeiro. Campinas: Mercado das Letras, 2004.







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